Vamos explicar desde o início. Para quem não é de Brasília e talvez não esteja familiarizado, o BRB é o Banco Regional de Brasília. Trata-se do banco público do Distrito Federal. Esse banco levou anos para reorganizar a própria imagem, porque entre o início dos anos 2000 e 2010 esteve envolvido em uma série de episódios marcantes, incluindo o caso que levou à cassação do ex-governador Joaquim Roriz, então senador. O episódio ficou conhecido como o escândalo da “bezerra de ouro”, envolvendo dois cheques do BRB em uma transação considerada esquisita na época. Joaquim Roriz, já falecido, teve grande relevância na política do Distrito Federal.
Feito esse contexto, avanço para o ponto atual. O BRB passou meses tentando comprar partes do Banco Master ou até mesmo adquirir o banco inteiro. Essa movimentação ganhou destaque quando, em fevereiro, o diretor de fiscalização do Banco Central, Ailton Aquino — o primeiro homem negro a ocupar uma diretoria no BC — sinalizou que havia problemas nos balanços do Banco Master. Aquino alertou sobre inconsistências, em especial na aquisição de créditos feita pelo BRB.
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A partir daí, ele comunicou o presidente do Banco Central, Gabriel Gallipoli, e oficializou o alerta. Ailton Aquino acionou Polícia Federal e Ministério Público Federal informando que as irregularidades encontradas poderiam indicar crime contra o sistema financeiro. Os dados foram enviados para investigação.
Para entender esse movimento mais amplo, é necessário voltar um pouco e observar a insistência do Banco de Brasília em adquirir ativos do mercado. É aqui que entra a relação com o ambiente político. A Polícia Federal trata o caso como um episódio de camaradagem, porque Daniel Vorcaro, do Banco Master, mantém relações com vários políticos em Brasília, entre eles figuras do centrão, como Ciro Nogueira, e também o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha. A PF aponta essa rede de relacionamentos, mas ressalta que amizades não justificam o uso de um banco abastecido com recursos públicos para socorrer outra instituição.
O BRB administra a folha de pagamento de vários servidores do Distrito Federal e tem forte presença no cotidiano financeiro da administração pública local. Diante disso, cresce a pergunta que os investigadores fazem: por que tanto empenho para adquirir um banco que ocupa a 38ª posição entre as instituições financeiras do país? É uma posição distante do topo do sistema bancário brasileiro.
Quando falo em esforço, incluo as compras de carteiras que o BRB realizou. Carteiras são conjuntos de papéis, investimentos e créditos adquiridos por meio de operações financeiras. Nesse caso, o valor é expressivo: 12 bilhões de reais. Repito: 12 bilhões de reais investidos pelo BRB em papéis vinculados ao Banco Master. Segundo os investigadores, esses papéis, na prática, não existiam. A comparação lembra a conhecida frase do padre Quevedo: “não existe”.
Retomando a linha do tempo: em fevereiro, Ailton Aquino faz o alerta e mobiliza os órgãos de investigação. O COAF passa a acompanhar o caso, monitorando as transações financeiras de grande volume. A Polícia Federal aprofunda a investigação. Paralelamente, o Banco Central segue com o trabalho técnico, especialmente porque meses depois o BRB formaliza o interesse em comprar o Banco Master.
Quando isso ocorre, o Banco Central solicita mais informações sobre a carteira de crédito que havia sido adquirida. O Master apresenta documentos, mas o Banco Central considera insuficientes. Brasília insiste: “Quero os detalhes da operação.” O Master entrega menos do que solicitado. A partir daí, inicia-se uma pressão política paralela sobre o Banco Central, questionando o motivo de tantas exigências. A resposta é sempre a mesma: seguir o que está na lei e agir “by the book”, como destacou uma fonte da Polícia Federal.
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O mercado financeiro, por sua vez, comenta há tempos que o Banco Master vendia investimentos com rendimentos muito acima do padrão. Enquanto um título de outro banco rendia cerca de 40% ao ano, o Master oferecia retorno de 140%. O mercado classificava essa prática como inviável em termos de remuneração.
Em setembro, após meses de solicitações e documentos inconclusivos, o Banco Central veta a venda do Master para o BRB. A determinação foi clara: a operação não poderia seguir adiante.
