Nas últimas semanas, declarações de China, Rússia e Irã indicaram que esses países estariam dispostos a defender a Venezuela diante de eventuais ações externas. Até o momento, porém, não houve explicações contundentes sobre como essa defesa ocorreria na prática. A ausência de medidas concretas, caso os fatos recentemente noticiados sejam confirmados, aponta para duas conclusões iniciais: não existe uma capacidade ampla de defesa venezuelana e as promessas feitas por potências como Rússia e China não se materializaram.
O silêncio dessas potências, especialmente de Moscou e Pequim, é destacado como um dado relevante. Se um episódio dessa gravidade ocorreu e não gerou reações públicas ou ações diplomáticas mais firmes, isso reforça a percepção de que o compromisso anunciado não se traduziu em atuação efetiva. A ausência de posicionamentos oficiais após os acontecimentos da semana anterior contribui para esse entendimento.
Uma reportagem publicada pelo jornal New York Times acrescentou novos elementos ao debate. Segundo a matéria, o ataque mencionado em declarações de Donald Trump teria sido operacionalizado pela CIA, e não por embarcações presentes na região. O ataque teria ocorrido por meio de drones, direcionados a um cais ou porto utilizado, supostamente, para o embarque de drogas destinadas aos Estados Unidos. De acordo com a apuração do jornal, não houve mortes, mas explosões efetivamente aconteceram em território venezuelano. Até o momento, essa é a principal informação disponível sobre o caso, que segue sendo tratado como extremamente sério.
O ponto central ressaltado é que, até agora, nenhum país se mobilizou para defender a Venezuela. Nem China nem Rússia demonstraram qualquer movimento concreto nesse sentido. Essa postura é comparada a outros conflitos recentes. Após dois anos de guerra em Gaza, não houve ações diretas contra Israel. Na Ucrânia, que se aproxima de quatro anos de conflito, a ajuda internacional ocorreu de forma indireta e limitada. Esses exemplos alimentam questionamentos sobre o funcionamento do sistema internacional.
Nesse contexto, surge a avaliação de que a Organização das Nações Unidas perdeu força. Criada pelas grandes potências após a Segunda Guerra Mundial, a ONU tinha como objetivo estabelecer limites à atuação de outros países, mas nunca aos próprios membros permanentes do Conselho de Segurança, que detêm poder de veto. Hoje, suas declarações são vistas como simbólicas, sem efeitos práticos. Essa fragilidade ficou ainda mais evidente com a recente posição dos Estados Unidos, que orientaram agências da ONU a se adaptarem, encolherem ou desaparecerem.
O cenário atual indica mais do que um simples desrespeito ao direito internacional. Há uma tentativa deliberada de afirmar que as regras multilaterais deixaram de valer sempre que entram em conflito com interesses nacionais. Essa lógica é associada a ações da Rússia na Ucrânia, de Israel em Gaza e dos Estados Unidos em operações recentes. Um exemplo citado ocorreu em Genebra, quando o governo americano anunciou a liberação de dois bilhões de dólares para ajuda humanitária da ONU, condicionando o repasse ao atendimento de interesses específicos e à destinação dos recursos aos países escolhidos por Washington.
A frase “ou mudam ou morrem” sintetiza essa postura. Algumas agências já enfrentam dificuldades severas, enquanto outras sobrevivem ajustando suas ações aos interesses americanos. Nesse cenário, intervenções militares passam a ser tratadas como possíveis sempre que consideradas necessárias por potências globais.
Diante da fragilização da ONU, surge a pergunta sobre o que virá depois. A resposta é descrita como sombria, pois o mundo atravessa um período de transição. A ordem internacional estabelecida em 1945 deixou de existir, e uma nova ainda não foi plenamente definida. Não há clareza sobre a estrutura de poder que prevalecerá nos próximos anos. Uma possibilidade seria a reformulação da própria ONU para se adaptar a essa nova configuração, o que seria considerado o melhor cenário. Outra hipótese é o abandono progressivo dessas instituições, algumas das quais já funcionam como estruturas quase irrelevantes.
Apesar disso, as agências humanitárias da ONU ainda prestam assistência a cerca de 100 milhões de pessoas no mundo. Esse número demonstra que seus efeitos são concretos e vão além de debates diplomáticos. Um exemplo recente envolve a República Democrática do Congo, onde cortes na ajuda humanitária resultaram no abandono de milhares de meninas vítimas de violência sexual, antes atendidas pela UNICEF, que enfrenta grave crise financeira.
Ninguém é capaz, hoje, de definir qual será a estrutura política da nova ordem internacional. Para países como o Brasil, resta insistir na existência de alguma forma de ordem e de regras internacionais, já que outras nações dispõem de arsenais nucleares, opção que não está disponível para todos.
Ao comparar o momento atual com 2001, quando George W. Bush falou em nova ordem mundial após os ataques de 11 de setembro, surge a avaliação de que o mundo vive agora uma “nova, nova ordem”. Naquele período, a China ainda não tinha o peso que possui hoje. Atualmente, é o maior parceiro comercial de mais de 120 países, o maior investidor na América Latina e o país que mais amplia seu arsenal nuclear, ainda que distante dos volumes de Estados Unidos e Rússia. Segundo avaliações do próprio governo americano, a China passou a representar o maior desafio existencial da história dos Estados Unidos.
Assim, embora 2001 tenha sido um marco, o momento atual é estruturalmente diferente. O que ocorre não é aleatório nem fruto de improviso. Há projetos de construção de novas hegemonias, envolvendo interesses profundos. Compreender esse processo exige uma leitura ampla dos acontecimentos, que revelam transformações significativas em curso na história internacional.
